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Quinta-feira, 15 Maio, 2025

A Igreja Católica e o espírito do tempo

Muitos vaticanistas apostaram em um conclave longo e em desavenças dentro da casa de Santa Marta, tantos outros cravaram que o novo Papa seria italiano, mas após 28 horas de deliberação, um norte-americano ocupa pela primeira vez a cadeira de São Pedro. Robert Francis Prevost, nascido em Chicago em 1955, é o primeiro papa nascido depois da Segunda Guerra Mundial e o único que cresceu com televisão em cores. De família com múltiplas origens étnicas e um extenso trabalho pastoral na América Latina, o padre Prevost se tornou Bispo em Chiclayo, no Peru.
Comandando uma diocese pobre e com poucos recursos, o bispo estadunidense conseguiu inspirar uma geração de jovens e chamar a atenção do Vaticano, o que lhe rendeu a nomeação de cardeal pelo Papa Francisco em 2023. Sua trajetória antes do pontificado terminaria com um cargo importante no Dicastério para os Bispos, ajudando na escolha de bispos em todo o planeta. Apesar de um perfil acadêmico e pastoral de destaque, o seu local de nascença o colocava automaticamente na retaguarda da lista dos Papabili. Mas como todos sabemos hoje, o cardeal Prevost foi anunciado na Loggia delle Benedizioni em 08 de maio de 2025 e se tornou Leão XIV, o 267° Papa da Igreja Católica.
Ao nos depararmos com uma escolha tão pouco usual, mas ao mesmo tempo tão bem recebida mundialmente, precisamos analisar as razões que colocaram um perfil tão peculiar na chefia da Santa Sé. Entre as mais diversas explicações, as possibilidades levantadas pelos cardeais na Capela Sistina e as apostas feitas nas bolsas mundo afora, a maior resposta esteja na maneira tão singular que a Igreja consegue interpretar o espírito do tempo, o conjunto de valores, ideias e atitudes necessárias para se compreender determinada época. Talvez uma breve caminhada pela história dos últimos pontífices nos ajude a exemplificar como a milenar instituição conseguiu dar aos católicos o Papa certo para o momento certo.

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Na segunda metade do século XIX, o mundo passava por um estado de ebulição. Os grandiosos maquinários geravam energia, transportavam pessoas e fabricavam produtos em tempo recorde. O campo e agricultura que eram a matriz econômica de muitas nações, perdiam espaço para as cidades e a indústria, e com isso uma classe camponesa se transformava em uma classe trabalhadora industrial. Em 1878 foi eleito pelo conclave Leão XIII, um Papa que olhou para fora das paredes das igrejas e se engajou fortemente nas causas sociais de seu tempo. Sua encíclica Rerum Novarum, colocava a Igreja como protagonista nas reivindicações trabalhistas que seriam fundamentais para o recém-formado proletário, vivendo em condições extremamente difíceis. 
Em 1914 a Primeira Guerra Mundial eclodia pela Europa e com ela enorme incerteza sobre o futuro dos estados nacionais formados no fim do século XIX e a Igreja. Naquele momento o diplomático Papa Bento XV lutaria não apenas pela unidade da Igreja, dividida geograficamente por vários beligerantes antagônicos, mas pregaria a neutralidade da Igreja Católica, para poder prezar pelos direitos dos civis independentemente da nação onde nasciam.
Anos mais tarde, em 1939, Eugenio Pacelli, se tornaria o Papa Pio XII, o mais polêmico e tradicionalista dos últimos 10 papas, mas figura fundamental para defender o catolicismo enquanto ideologias totalitárias e contrárias ao cristianismo tomavam a Europa de Leste ao Oeste. No pós-guerra, a necessidade de uma Igreja menos aristocrática e mais próxima aos fiéis escolheu os reformistas João XXIII e Paulo VI para encaminharem o Concílio Vaticano II, que instituiu a missa nas línguas locais e realizou gradual abertura ao mundo moderno.
Em uma época de incertezas, onde a Guerra Fria fragmentou o mundo e trouxe grande medo de um novo conflito global, o olhar sereno e as palavras firmes de João Paulo II, guiaram cerca de 1 bilhão de fiéis por mais de 26 anos, elevando a figura do Papa ao protagonismo mundial na mediação de conflitos e na busca pela defesa dos direitos humanos. Em uma época de carência intelectual, a Igreja encontrou o brilhante teólogo Bento XVI e quando precisava do afago de um abraço para todos os esquecidos, encontrou Francisco.
O espírito do tempo dentro do contexto católico não significa mudar as estruturas e a essência, afinal uma instituição que se casa com uma geração, estará viúva na próxima. Muito menos se trata em tornar a Igreja um local de competição constante com o mundo exterior, onde apenas entretenimento e passatempos são oferecidos. O espírito do tempo no viés da Igreja vai ao encontro de dar à Roma o bispo necessário para os anseios daquele momento e dar ao mundo um homem que tenha o perfil adequado para enfrentar os desafios dentro e fora dos muros da Igreja.
Em relação a isso, vemos que Leão XIV, com sua formação em matemática e seu olhar analítico será de grande utilidade para compreender as dinâmicas mudanças do século XXI, ao mesmo tempo que seu sorriso manso e clamor pela paz vão ao encontro preciso de uma voz imparcial que preze pelas vítimas de guerra. Seu cantar em latim durante as orações remete às belas tradições de um tempo perdido, enquanto sua visão sinodal mantém as portas das igrejas abertas a todos, sem segregação.
Aquilo que conseguimos concluir, sejamos fiéis, sejamos mero observadores, é que através de figuras falhas, homens com suas próprias particularidades, o espírito do tempo foi sempre muito bem interpretado pela Igreja Católica e talvez seja além dos fatores divinos, a principal razão para sua unidade e forte presença mesmo 2 milênios após a passagem de Jesus Cristo pela Terra.

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Fonte: Jovem Pan

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